Relatos Selvagens: todo sentimento nu é dramático

Todo sentimento nu é dramático. E isso é o extraordinário em Relatos Selvagens. O filme nos reapresenta à nossa natureza bruta.

Dirigido por Damián Szifron e produzido por Agustín e Pedro Almodóvar, o longa ficou em cartaz por anos e fica o apelo para quem ainda não o assistiu.

O roteiro é pura criatividade, mas o melhor mesmo são as intenções nuas dos personagens.

Com Ricardo Darín, Oscar Martinez, Leonardo Sbaraglia, Relatos Selvagens rediscute a noção de justiça, responsabilidade e respeito fazendo rir – ainda que seja o “rir para não chorar”. O filme é selvagem porque é exagerado, como tudo que é humano e não passou por filtros morais.

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Cena de Relatos Selvagens.

A trama conta seis pequenas histórias sem nenhuma relação uma com a outra. Nenhum personagem ganha pela tentativa de heroísmo. Antes, são verdadeiros anti-heróis.

As histórias partem da possibilidade irregular de podermos realizar todas as nossas vontades. Mate se quiser matar, agrida se quiser agredir, faça justiça com as próprias mãos, assuma a vontade de não sustentar mais a própria vida, aproveite-se de qualquer situação que possa lhe proporcionar alguma melhoria de vida.

O território é mesmo fértil de lições “imorais”. Ou de desejos mal confessados. E, de algum jeito, os personagens levam a cabo muitas das nossas vontades, impossível negar.

Relatos Selvagens trata da vingança e dos vários tipos de vingança, a ver três exemplos: a que praticamos com engenhosidade, dedicando horas a planejar o melhor jeito de torturar quem nos fez mal; a que resistimos, quando diante da possibilidade de ferir chegamos à conclusão óbvia de que nada vai apagar a dor sentida; e a que praticamos com calor, com todos os sentimentos inflamados, quase sempre uma reação imediata a algo que doeu. Essa, sim, talvez, a única vingança passível de se viver sem grandes julgamentos, porque é o tipo de vingança que nos deixa mais próximos da absolvição, por ser mais instintiva.

Fala-se ainda de arrogância, de amores perdidos e resgatados, do que não levamos às últimas consequências pela verdade de que nada deixará de ser como é. Também fala do contrário, do que levamos até às últimas consequências, o que inevitavelmente nos coloca em outro patamar de dignidade. Perante nós mesmos e, com sorte, perante os outros.

Por tudo isso é que tanto barulho em torno de Relatos Selvagens não é por nada. O filme é mesmo extraordinário. Apelo feito.

 

 

Eliana de Castro Escrito por:

Fundadora da FAUSTO, é escritora, mestre em Ciência da Religião e autora do romance NANA.

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