Assistam ao espetáculo O Bem Amado!

O Bem Amado, a premiada versão musicada de Ricardo Grasson do clássico de Dias Gomes, é o típico espetáculo que nos damos de presente quando necessitamos de encanto, beleza, bom-humor, criatividade — e de algo verdadeiro.

Em cartaz no Teatro FAAP, a peça é estrelada por Cassio Scapin, que dá vida ao emblemático Odorico Paraguaçu.

No elenco, constam ainda Eduardo Semerjian, Paulo de Pontes, Luciana Ramanzini, Kátia Daher, Lola Fanucchi, Ando Camargo, Magno Argolo, Heitor Garcia, Dan Maia, Roquildes Júnior, Bruno Menegatti e Daniel Warschauer.

A trilha sonora, criada com primor por Zeca Baleiro e Newton Moreno, é responsável por grande parte da atmosfera fabulosamente provinciana. A direção musical fica por conta de Marco França.

Com cores vivas no lúdico cenário de Chris Aizner, além do figurino no tom certo do pitoresco de Fábio Namatame, o espetáculo O Bem Amado foi montado para celebrar os 100 anos de nascimento do escritor baiano.

Os primeiríssimos parabéns devem ser dirigidos a Kátia Barros e Tutu Morasi, responsáveis pelo movimento e pela coreografia. O ritmo da peça tem um quê de ludicidade que nos leva para dentro da história de forma mágica.

Fiquei a pensar, depois de sair do teatro, no trabalho que a Velloni Produções Artísticas vem realizando…

Colocar uma montagem com esse nível de meticulosidade, sem o total apoio das leis de incentivo? Como O Bem Amado merecia ir para a estrada Brasil afora! Faço coro ao apelo de Scapin: há algum mecenas por aí?

Escrevo com frequência acerca dos “presentes” que devemos dar a nós mesmos, e normalmente é quando uma montagem ultrapassa um nível sutilíssimo de delicadeza. Faço isso porque creio que é nele que devemos nos segurar para lidar com o restante da vida.

O último espetáculo que me causou a mesmíssima sensação foi Madame Blavatski – Amores Ocultos, a encenação transcendente de Mel Lisboa — que, logo depois, presenteou-me com uma entrevista exclusiva com teor mais filosófico. Mas voltando a O Bem Amado

Alfredo de Freitas Dias Gomes escreveu a história do político corrupto e demagogo Odorico Paraguaçu em 1962.

Intitulada, à época, Odorico, o bem amado e os mistérios do amor e da morte, a história conta a saga do político morador de Sucupira, cidade fictícia do litoral baiano. A trama acabou ultrapassando as linguagens, tornando-se não apenas um clássico do teatro, mas também da televisão.

Como noveleira de carteirinha, conto que O Bem Amado foi a primeira novela exibida em cores no Brasil, assim como a primeira a ser exportada. Na versão da TV, de 1973, Paulo Gracindo levou o peculiar personagem aos rincões do Brasil.

Não mudou quase nada do Brasil de 1962 para o Brasil de 2023, a não ser a caretice.

É por isso, quem sabe, que a peça O Bem Amado alcança o público com tanta leveza, como um vento bem-vindo a nos aliviar das amarras de posturas impostas, comunicação descabida e humor de gosto muitíssimo duvidoso.

De 1962 a 2023: os temas humanos continuam humanos; os hipócritas ainda mais hipócritas; mas os corruptos, ah! Esses estão travestidos de agentes do amor. Mas as políticas continuam ineficientes e a prioridade social virou pronome.

Dentro e fora dos palcos, uma causa continua servindo ao seu sujeito.

A história de O Bem Amado é atual. Engatada por Odorico, político que deseja ganhar as próximas eleições, ele sai pela comunidade prometendo dar à cidade um cemitério próprio, uma vez que seus mortos precisam ser enterrados nos municípios vizinhos.

Vote em um homem sério e ganhe um cemitério

Odorico vira prefeito!

Espremendo orçamento aqui e ali, e de tão carismático que é, Odorico Paraguaçu conta com o apoio do povo, sobretudo das mulheres, casadas e solteiras. Mas um cemitério pede mortos. E não morre ninguém nos três anos seguintes.

Cada vez mais desesperado, Odorico vai renunciando aos escrúpulos, mas o destino faz troça com o político e continua impedindo que alguém morra em Sucupira.

Eis então que Odorico tem uma grande ideia! O sabichão decide trazer de volta à cidade o pistoleiro Zeca Diabo, com quem faz conchavo para jamais ser preso, caso, assim, “sem querer”, mate alguém.

Odorico Paraguaçu coloca Zeca Diabo como delegado.

O que o prefeito jamais poderia prever é que o criminoso fez votos de virar um homem correto. Ironicamente, Zeca Diabo cumpre seu ofício com esmero.

Apesar de o texto ser um clássico, de fazer parte do imaginário popular, é uma pena que poucos o conheçam. O fim da história consta na sinopse do espetáculo, mas não contaremos aqui.

Cabe a nós apenas o apelo: assistam ao espetáculo O Bem Amado!

Porque desejamos que a experiência de encanto seja do primeiro ao último minuto.

E de uma maneira muita delicada, desejamos que nasça um orgulho do talento artístico de nosso povo, porque O Bem Amado é lindo!

Esse Brasil…

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Eliana de Castro Escrito por:

Fundadora da FAUSTO, é escritora, mestre em Ciência da Religião e autora do romance NANA.

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