Injustiça e desespero. Duas palavras definem o filme russo Leviatã, que concorreu ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2015.
Em Cannes, o longa de Andreï Zviaguintsev faturou na categoria Melhor Roteiro. E é mesmo merecedor.
O longa dá voltas interessantes, destacando em cada uma delas um dos personagens – e sem perder o fio melancólico que costura toda a trama.
O soberano absoluto – referência ao clássico livro de Thomas Hobbes, O Leviatã, publicado em 1651, até hoje uma das obras mais influentes do pensamento político – está presente o tempo todo. E é representado principalmente pelo prefeito Vadim, vivido por Roman Madianov. Ele é quem oprime e massacra Kolia, um simples mecânico vivido por Alexeï Serebriakov.

A história de Leviatã acontece numa cidadezinha na região do Mar de Barents, litoral da Rússia. Zviaguintsev registrou cenários belíssimos de natureza remota, o que contribuiu ao tédio, ao mistério e ao flerte com a morte da vida desgraçada de Kolia.
O mecânico destemperado briga na justiça para não perder sua casa, localizada em um terreno que o corrupto prefeito decide tomar para si, para construir um grandioso empreendimento turístico. Lucros. A briga é triste porque é a mesma de todos os dias, em quase todos os lugares do mundo, quando o mais forte impõe suas leis sobre o mais fraco.
Kolia tenta, ao contar com a ajuda de um amigo advogado de longa data, que vive em Moscou, vencer e continuar com sua vida de homem comum – irrelevância que lhe foi roubada.
Dimitri é o amigo, vivido por Vladimir Vdovitchenkov. O advogado possui um dossiê que pode ajudar na bravata de Kolia.
Os dramas menores da vida do mecânico não são menos dramáticos do que o drama maior, o de perder sua casa. Principalmente os que envolvem Lilya, sua esposa.
O filho adolescente de Kolia, de seu primeiro casamento, o rebelde não sem causa Roma, é também outro pequeno grande problema, esse não menos desesperado e sem amparo do que os demais, então adultos e teoricamente mais capazes de alguma autonomia em suas vidas. Todas as atitudes de Roma são justificadas pela “idade complicada”, o que não é verdade. Roma é o reflexo das relações desestruturadas. A tristeza e a solidão do garoto marcam tanto quanto a prisão na qual se trancou sozinha a esposa Lilya, cujo amor pelo enteado, pelo marido e por si mesma revelam muito nesta trama.
Leviatã segura o espectador do começo ao fim. São 141 minutos de real envolvimento com as emoções dos personagens. O mar tranquilo à beira da casa de Kolia é apenas uma alegoria. Cheio de quinquilharias, submersas ou nem tanto, é a luta contra o abuso do poder. E quem pode vencer este mar? As bestas que nele residem não são ninguém mais do que nós mesmos. Como disse Hobbes: O homem é sim o lobo do homem.
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