Maravilhosa graça

Olhos de acuado, repelindo o medo de ser quem é. Dedos no violão que disfarçam a sensação de não ter chão. Onde quer que vá, o que quer que faça, nada finda o grito que abafa o receio de ser verdade que é mesmo fraco.

Se posso rascunhar algo que alcance seu coração é sobre a graça. Essa mesmo que Yancey definiu como “a última palavra perfeita”.

Logo eu, logo eu, que quase toda a vida duvidei que um dia o dom gratuito de Deus pudesse me enxergar nos espelhos d’água de meus próprios olhos de acuada.

Sempre soube que não é tão difícil acreditar na existência da graça. Difícil é acreditar que, ao abraçá-la, não é na verdade ao vento.

Enquanto acreditei em direitos morri aos poucos, só vivi de verdade quando agradeci. E então amei.

Graça é o presente.

Futuro é promessa, passado é providência.

Graça é o presente; e seu estado, a vida que pulsa.

Por isso mesmo, então, que sou eu a dizer-te: a graça é transformadora, e muitas vezes insuportável – e é nisso que se confunde e se destrói.

Para aceitar a graça é preciso ser quebrado ao meio, depois em pedaços, e do orgulho tirar suas raízes.

A graça nos vinga de nós mesmos, principalmente quando prova que o céu às vezes se traveste de mão estendida.

Sossegue as cordas que delas tenta tirar sua dor. Repelir o amor é saída ágil, mas que dá em muro alto. Só os corajosos são vulneráveis.

É o contrário mesmo. Como a graça é contrária à ordem do mundo. Graça não é para além, é apesar de. Graça é a sombra de quem sabe amar mais.

E graça é virulenta. Porque basta que me alcance para que eu me expanda e tire outro da reclusão na desgraça. Graça nunca foi sobre reciprocidade, é sobre ininterrupção.

Mesmo que não esteja preparado para retribuir, pode assim mesmo desfrutar dessa imensidão em segundos. Esse quase nada que passa, mas retém tudo.

 

 

 

 

Eliana de Castro Escrito por:

Fundadora da FAUSTO, é escritora, mestre em Ciência da Religião e autora do romance NANA.

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