A ironia, de todos os incômodos que causa, o pior deles é o de levar o chão da certeza. Quem não se incomoda com a ironia?
Eu sei quem confia em mim. Nos meus atrevimentos. Nas minhas dúvidas que são punhais, ora a me ferir, ora a me ferir mais uma vez.
O irônico é um demônio sedutor. Porque afronta convenções, conveniências e arruína convicções — esses castelos de areia nos quais confiamos o sono —, ele não conta mentiras.
É quando a relação se inverte. Porque amar e odiar um irônico trata-se de um jogo impossível de escapar. Quem fica por cima é quem não mente para si mesmo.
Realizei o sonho romântico de ter um eu. Porque sou irônica, e na ironia consigo não me deixar importunar, desvio qualquer um do roubo do melhor de mim.
Tenho dificuldade de preservar a sensibilidade de que preciso para escrever ante um mundo que ataca e fere.
Se minha alma cria casca, morro como escritora. Não presto para nada sem autenticidade. Se não crio casca, abandono-me à própria sorte.
Ironia é uma casca.
Realizo minhas vinganças em devaneios antes de dormir. Transformo cada um numa palavra de gargalhada. Sou romancista irônica pungente.
Escrevo tudo isso porque estou reunindo minhas próprias palavras. As que me definem e as que posso explicar por que me definem.
Venho tomando como amparo de autocompreensão o lançamento da É Realizações: O Dicionário do Conservadorismo.
São 704 páginas, com mais de 200 verbetes, sob direção de Frédéric Rouvillois, Christopher Boutin e Olivier Dard. A tradução quem assina é Luiz Paulo Rouanet.
Importante dizer que O Dicionário do Conservadorismo é o primeiro volume da tríade que logo mais contará com O Dicionário do Populismo e o O Dicionário do Progressismo.
Apreciei a definição que consta no tomo:
“A ironia é ao mesmo tempo uma atitude, uma maneira de ser, uma filosofia da existência, e pode-se também analisá-la simplesmente como figura de retórica, estilo de expressão que consiste em dizer o contrário daquilo que se pensa por variadas razões: humor, agressividade, manipulação, ostracismo, autoproteção.”
Eu.
Na ironia, tratamos os tormentos de forma civilizada.
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