Envelhecer é assistir a tudo escapar. É constatar que nunca nada foi seu. A vida é um presente que recebemos aos poucos e aos poucos nos tomam de volta. Quem é capaz de falar a verdade sobre envelhecer?
Seria libertador desaparecer? Primeiro para os outros, depois para nós mesmos. Fulvio Stefanini encena todas essas questões no espetáculo O Pai, em cartaz no Teatro Uol, no Shopping Pátio Higienópolis, em São Paulo.
O ator, que comemora 68 anos de carreira, reestreia com essa premiada montagem pela qual ganhou o Prêmio Shell de Melhor Ator. A peça, encenada em mais de trinta países, foi escrita pelo dramaturgo francês Florian Zeller.
Fulvio Stefanini dá vida a André, um idoso de 80 anos, cuja deterioração do corpo, sobretudo da mente, mostra grandes vestígios. O drama não é só de quem envelhece, mas também de quem convive. Sua filha, Ana, vive o dilema de cuidá-lo ou interná-lo.
Tema que não escapa a nenhum ser vivo; não pensar na velhice ou na morte é fazer a ocasião para a juventude e o sucesso serem traiçoeiros.
O drama psicológico de O Pai também levanta questões mais filosóficas: o que faz do homem o homem? Seu corpo? Seu vigor? Sua mente? O futuro é um lembrete de que precisamos de um novo nós, a cada ano que envelhecemos?
É raso falar apenas de uma pele flácida quando discutimos o envelhecer. Mas não são os acúmulos de histórias e paranoias que pesam mais?
Envelhecer não diz mais sobre o corpo do que diz sobre a alma, essa intangível, que tem forma de Deus e de diabo, dois faceiros que dividem o comando e constroem o que entendemos ser “nós”.
A montagem brasileira de O Pai é dirigida por Leo Stefanini. No palco com Fulvio estão Carol Gonzalez, Paulo Emílio, Wilson Gomes, Deo Patrício e Carol Mariottini.
O texto pungente de Florian Zeller foi adaptado para o cinema no estupendo filme Father, de 2020, estrelados por Anthony Hopkins e Olivia Colman. Pela atuação no longa, Hopkins levou o prêmio de Melhor Ator.
Na atuação de Fulvio Stefanini vemos sutilezas: o olhar choroso, os lábios trêmulos, o fingimento. O tempo passa e nos sentimos mais autênticos ou o tempo passa e apenas nos tornamos mais cínicos e mentirosos?
Pode ser que envelhecer seja se libertar de padrões e crenças. Mas já existe a ansiedade oriunda da consciência de saber que não há mais tanto tempo, mesmo que haja dinheiro ou liberdade.
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