Alexandre Galindo: “O teatro é um lugar de identificação”

Ator, produtor e empreendedor, o carioca Alexandre Galindo, nosso entrevistado, não é do tipo de artista utopista, na verdade, se considera um pessimista. Nesta conversa com a FAUSTO, o homem que dá vida a vários personagens no palco fala sobre o teatro e sua relação com a existência — e tudo que a permeia. Galindo é um dos atores à frente do Teatro Estúdio, em São Paulo, e conhece muito bem os sabores e dissabores de desempenhar arte no Brasil. Leia a entrevista completa:

FAUSTO — Por que estar em cena?
Alexandre Galindo: São muitos os porquês. Um deles, é afirmar que somos atores e atrizes. Acredito que, diferentemente de uma profissão convencional onde você trabalha, se aposenta e diz “eu fui tal profissional”, na nossa profissão queremos ser atores e artistas até o último respiro. Fazemos uma arte muito efêmera, estar em cena nos dá a sensação que somos, e não que fomos. É uma necessidade constante de afirmação da profissão na sua vida. A singularidade do encontro entre ator e plateia também é um dos motivos de estar em cena. Viver, a cada apresentação, um momento que não vai se repetir nunca mais é um grande privilégio para ambos, uma experiência única. Estar em cena sempre nos coloca na beira de um precipício, no qual podemos cair a qualquer momento. É sempre uma ótima oportunidade de correr riscos e “flertar com a morte”.

O teatro é um lugar de esperança?
Como pessimista que sou, acredito que não. O teatro é um lugar de identificação e reflexão. Avançamos enquanto mundo e sociedade em muitos quesitos, porém, retrocedemos cada vez mais enquanto humanidade — é a minha visão do Brasil e do mundo. Portanto, se o teatro espelha a vida, ele nos coloca muito mais no lugar de refletir do que esperançar.

A maior luta de nossas vidas está na imaginação?
Para mim, sim. Tenho uma tendência a supervalorizar as dificuldades e os problemas enfrentados. Quando nos distanciamos e conseguimos olhar de fora dá para perceber que são um pouco menores. Então, tenho trabalhado constantemente esse olhar. Vivemos num mundo muito acelerado e processamos uma quantidade imensa de informações diariamente. Isso afeta muito a nossa percepção.

O fato de o palco ter dimensões — diferentemente de uma tela, que é plana — instiga mais o espectador a desvendar as intenções do autor e da equipe que realiza a montagem? Instiga mais a nos perguntarmos por que aquele objeto e não outro, por que aquela roupa e não outra…Em outras palavras, o cinema instiga menos?

Acho que é uma visão muito pessoal de cada espectador. O teatro tem a experiência singular, única, efêmera de se viver aquela experiência ao vivo; o cinema, por outro lado, tem recursos que proporcionam experiências que o espectador não encontra no teatro. Eu, como espectador e ator, prefiro mais as experiências do teatro.

No teatro, por mais que o espectador só assista, ele também atua, por exemplo, como uma testemunha? Eu tenho essa sensação de que sou testemunha… Isso me causa sensações, tipo uma responsabilidade… Arte se ensina?
Sim. Ela sempre nos ensina, tem algo de pedagógico, o ato de testemunhar e refletir sobre o que está vendo ou acabou de ver nos leva a algum aprendizado. Vejo nas artes cênicas sempre uma oportunidade de olhar para dentro de você, da sua humanidade, da sua relação com o mundo e se modificar a partir disso.

Encenar espetáculos que descem fundo na natureza humana — como “Álbum de Família”, aquele desbunde de montagem — permite ao ator se conhecer melhor, inescapavelmente?

Esses espetáculos nos permitem descobrir novos recursos internos para o trabalho de atuação. Digo isso porque sempre crio um distanciamento entre o ator e a pessoa física nesses processos de criação e encenação de espetáculos. O que ajuda a me conhecer melhor são as dinâmicas e relações humanas daquele trabalho e não a obra em si.

O que sacia o desamparo da alma humana?
Realizar as coisas que ama fazer, sobretudo quando consegue trabalhar com aquilo que ama. Porém, eu diria que isso minimiza o desamparo, pois, em alguma medida, ele sempre vai existir.

Amar é suficiente?
É necessário, mas não é suficiente, pois os amores se transformam, acabam. É preciso amar para estar vivo.

Como sobrevive um ator no Brasil? E como sobrevive um produtor de teatro no Brasil? São sobrevivências distintas? Mais na TV e menos no teatro ou hoje está todo mundo no mesmo barco? Não basta ser artista, tem que saber empreender?

É preciso contextualizar essa resposta com algumas informações. A cultura é uma pasta subvalorizada em todos os governos no Brasil, com pouco orçamento; o teatro é pouco descentralizado, a população não é educada para frequentar salas de teatro, o audiovisual não retomou com a força esperada no novo governo, dentre tantas outras questões que criam muitas dificuldades para a produção nacional, no teatro e no audiovisual. Neste cenário, são poucos os atores que conseguem sobreviver apenas do trabalho de atuação, é sempre preciso ter outras atividades em paralelo como fonte de renda para sobreviver, e a produção teatral é uma delas. O produtor de teatro, assim como o ator, depende de trabalhos constantes para sobreviver, porém, vejo que há mais oportunidades na produção que na atuação, portanto, uma chance maior de estabilidade profissional. Quando a TV aberta tinha um grande monopólio do audiovisual e os atores tinham contratos fixos, sem dúvida que era mais estável e rentável que o teatro. Hoje as coisas mudaram, o audiovisual está muito mais pulverizado e os contratos não são fixos, há muitos atores de TV voltando ou migrando para o teatro, aproveitando a visibilidade que já tem. O ideal seria, de fato, conseguir sobreviver da sua própria arte, mas enquanto isso não se torna uma realidade, costumo dizer que é preciso ganhar dinheiro para poder fazer a sua arte com tranquilidade. Então, é preciso empreender, seja na arte ou fora dela.

***

Acompanhe as novidades da FAUSTO pelo Instagram!

Conheça também meu primeiro romance, NANA, um elegantíssimo convite ao autoconhecimento e à autorreflexão.

Disponível na Amazon!

NANA livro

Eliana de Castro Escrito por:

Fundadora da FAUSTO, é escritora, mestre em Ciência da Religião e autora do romance NANA.