A Rosa Mais Vermelha Desabrocha: ninguém está a salvo de ser amado

Depois de assistir ao espetáculo A Rosa Mais Vermelha Desabrocha, saí leve, levíssima, tão disposta a amar que amei a Lua em sua fase crescente.

Banhei-me pensando em minha identidade. De pijama dancei com meu cachorrinho a canção Gente Aberta do meu Erasmo.

Eu sou uma rosa vermelha que desabrocha todo dia. E não importa o que aconteça, ou se não me reconhecem, eu amo pequeninas coisas e sou capaz de me doar sem medo.

A Rosa Mais Vermelha Desabrocha é uma adaptação da HQ homônima de Liv Strömquist, que suscita a reflexão acerca do amor e da paixão como dois que não existem mais — ou não duram.

Face ao superabundante estímulo de aplicativos para tudo: comprar, transar, assistir, perder tempo, não sobra disposição para os verdadeiros afetos.

Porque os verdadeiros afetos dão trabalho.

O amor foi o ato fundador da humanidade — para os que creem em Deus.

E desde que o mundo é mundo, quantos tratados, livros e debates acerca do amor foram gerados, embora nunca se tenha chegado a uma definição ou fórmula.

Todavia, nunca antes na história da humanidade fomos tão preguiçosos para amar.

Uso preguiça, não incapacidade.

Preguiça porque tudo é mais fácil do que amar.

Por que perder tempo se podemos nos realizar profissionalmente, viajar, ter a casa dos sonhos?

Fernanda Viacava, Bianca Lopresti, Carolina Splendore e Lenise Oliveira nos conduzem pelas dores e delícias de amar e ser amado.

Por toda a concepção e dramaturgia, parabéns para Bianca Lopresti, Ale Paschoalini, Lígia Souza, Fernanda Rocha, Isabel Wolfenson e Paula Picarelli.

Há tantos nomes na produção que mereciam ser apresentados com suas funções bem explicadas, mas não sou crítica de teatro, sou apenas cultora de sensibilidades.

A Rosa Mais Vermelha Desabrocha mescla com muita perspicácia notas históricas, humorísticas, sintomas da contemporaneidade, os ideais — claro, porque ainda esperamos o amor de nossas vidas — e o que mais me tocou: a nota espiritual.

O amor sempre foi meu tema predileto e meu mestrado em Ciência da Religião teve como objeto de análise o romance Anna Kariênina, de Liev Tolstói.

À luz do movimento romântico e do cristianismo ortodoxo brinquei do impossível, tentando definir esse sentimento que é uma unanimidade — ainda que façamos de tudo para anulá-lo ou vencê-lo.

Aliás, tentar vencer a vontade do amor romântico é um sintoma da contemporaneidade.

Como escreveu Lipovetski: “Há algo no amor-paixão que transcende as suas metamorfoses históricas: o amor será sempre o amor.”

Da mesma forma, é da natureza do amor ser refém do destino.

A paixão que faz bambear as pernas já foi chamado de amor cortês, de Eros, e, por fim, sua forma mais conhecida: amor romântico.

Se para o Romantismo o amor é uma força sem igual, altiva, potente, transformadora — para o bem e para o mal —, embora entregue às vontades espontâneas do homem; para o cristianismo o amor tem um valor espiritual. E é praticamente impossível rompermos com nossa cultura de forma que não consideremos os sentimentos como o concebemos em nossa estrutura humana.

O final de A Rosa Mais Vermelha Desabrocha tocou-me profundamente. Óbvio que não vou contar, mas reforço que o valor espiritual naquela explicação é de uma sabedoria tremenda.

Para os céticos, como a personagem da Viacava, que foi casada por 25 anos, deixo um recorte do romance A Sonata a Kreutzer, também do Tolstói.

Nessa novela, há sentenças pessimistas como: “Amar a vida inteira um homem ou uma mulher é o mesmo que dizer que uma vela vai arder a vida toda…”

É certo que, para aquele que o experimenta, como escreveu Bataille, o amor “pode ter um sentido mais violento do que o desejo dos corpos”, e ele ressalva: “jamais devemos esquecer que, a despeito de todas as promessas de felicidade que o acompanham, ele introduz, antes de mais nada, a perturbação e a desordem.”

Então, é mesmo do caráter do amor ser refém do destino. Só existe amor eterno contrariado. Não há paixão sem luta. É preciso ser Werther ou nada.

Como uma rosa mais vermelha, deixo a pergunta:

Por que seria preciso amar raramente para amar muito?

Eu já acreditei que não poderia ser amada. E tudo começa por aí!

Muitas pessoas acreditam e não dão conta de assumir.

O amor também pode surpreender começando por uma compreensão de nós mesmos.

A Rosa Mais Vermelha Desabrocha é uma peça maravilhosa: lúdica, engraçada, rimos de nós mesmos o tempo todo, e o mais importante: ela não deixa ninguém ir embora sem esperança.

Assistam!

E amem!

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Eliana de Castro Escrito por:

Fundadora da FAUSTO, é escritora, mestre em Ciência da Religião e autora do romance NANA.