Mirian Goldenberg: “Para a mulher, o corpo jovem, magro e sensual é verdadeiro capital”

Helen Mirren, Sarah Jessica Parker, Julianne Moore. Esses são apenas alguns dos nomes que estão tornando ultrapassado o conceito de envelhecer. O mundo está mesmo mudando. Seja por esses expoentes ou pela questão social que impactará fortemente o planeta nos próximos 50 anos, os velhos não são mais os mesmos. E que bom! Tema de anos de pesquisa da antropóloga Mirian Goldenberg – que lançou A Bela Velhice em 2013 – a pauta volta à agenda com o mais novo título Velho é Lindo!, recém-chegado às livrarias. Organizado por Goldenberg, a publicação conta com artigos de seus orientandos no Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, além de outros intelectuais. A leitura é, como tudo da colunista da Folha de S.Paulo, uma delícia. Mais importante, porém, é o convite à reflexão. Com exclusividade para a FAUSTO, Mirian Goldenberg bate um papo sobre esse tema que – touché! – não escapará a ninguém.

Foto: Peter Lindbergh.

FAUSTO – A ideia de “Velho é lindo” é mais um assunto da moda ou está realmente acontecendo uma mudança na maneira de entender a velhice?
Mirian Goldenberg: Os dois fatos estão ligados. A velhice mudou completamente: vivemos muito mais e muito melhor. A mudança foi muito rápida. Até recentemente não tínhamos exemplos públicos de velhos ativos, bonitos, produtivos como Fernanda Montenegro, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Chico Buarque, Marieta Severo, Ney Matogrosso e tantos outros. Gosto de dizer que eles não são velhos, são ageless, sem idade, inclassificáveis. Fazem parte de uma geração que revolucionou comportamentos e está mudando a forma de representar e experimentar a velhice. É uma geração fundamental para o mercado, são consumidores exigentes e em número cada vez maior. Por isso, estão na moda: nos filmes, nas novelas, nas propagandas etc.

O mercado já assimilou esse movimento?
Ainda não. Continua com rótulos e estereótipos, ou o velhinho tipo jovial ou a velhinha espertinha, ou os velhos avós etc. E não existem produtos adequados para esta geração de novos velhos. Basta procurar uma calça jeans para notar a dificuldade. É uma geração que quer conforto, beleza e também produtos adequados que não sejam “de velhos” ou “de jovens”.

Quem mais difunde a ideia do “sair de cena” na velhice, o jovem ou o próprio velho?
Quem tem mais pânico e mais preconceito são os jovens, especialmente as mulheres jovens. Digo que no Brasil, para a mulher o corpo jovem, magro e sensual é um verdadeiro capital. Por isso, ela tem pânico de envelhecer. No entanto, como mostro nos meus livros, depois dos 60 elas dizem que é a primeira vez que se sentem livres, que podem ser “elas mesmas”. E consideram o melhor momento de suas vidas.

Erotismo é assunto mais tabu do que sexo?
Sinceramente, este não é um tema que aparece com força nas minhas pesquisas. Meus pesquisados não dão tanto valor assim ao sexo. Aqueles ou aquelas que gostavam, continuam gostando. As que não gostavam, dão a velhice como desculpa para não fazer mais algo que nunca apreciaram.

A mulher parece ficar com uma parte maior da conta, principalmente em relação à sexualidade, não? Mick Jagger pode ser um símbolo sexual aos 72 anos, mas Madonna não, pelo menos ela é muito mais criticada…
Discuto muito esta questão no livro que estou escrevendo agora. O que a mulher mais velha pode ou não fazer. Aquela que continua exercendo sua sexualidade é acusada de velha sem noção, coroa periguete, velha assanhada e por aí vai. É um tema tabu muito importante de ser debatido para acabar com estas rotulações. Meus livros, especialmente A Bela Velhice, debatem muito esta diferença entre homens e mulheres. É interessante pensar que ela é um modelo de envelhecimento, positivo e também negativo para muitas mulheres. Ela é invejada, admirada por ter uma vida plena, com quase 60 anos, mas também é criticada por “namorar garotão” e se vestir inadequadamente para a idade. Esta ambiguidade consolida o mito de mulher transgressora.

Madonna ainda pode ser considerada uma revolucionária?
Acho que sim, apesar de estar também sofrendo com o envelhecimento e tentando fazer o que é possível para manter a aparência jovem. Outras mulheres estão vivendo de forma mais livre o envelhecimento, como a atriz Susan Sarandon, por exemplo. Aqui no Brasil também temos alguns (poucos) exemplos. Acho que Leila Diniz, que teria 71 anos, seria revolucionária. Continuaria amando, namorando, vivendo, tendo prazer, sem medo das imperfeições. Betty Faria que recentemente foi muito criticada por ir de biquíni à praia, aos 73 anos, também é. “Quer dizer que por ter envelhecido não posso mais usar biquíni/ Tenho que ir à praia de burca?” Ney Matogrosso que continua super sensual com seu corpo despido nos shows. São revoluções do cotidiano, que todos nós podemos fazer para terminar com os rótulos e preconceitos.

Não perder a capacidade de sonhar é o segredo?
Ter um projeto de vida, uma vida com significado, rir muito mais de si mesmo, não se preocupar tanto com a opinião dos outros, colocar o foco na própria vontade, não desperdiçar o próprio tempo, fazer uma faxina existencial, aprender a ligar o botão do foda-se e dizer não. Estes são os segredos que aprendi com meus pesquisados e especialmente com minhas pesquisadas de 60 a 95 anos.

 

 

 

 

Eliana de Castro Escrito por:

Fundadora da FAUSTO, é escritora, mestre em Ciência da Religião e autora do romance NANA.