Ouro Preto: “Valha-me Deus” é o 2º romance de Eliana de Castro

Livros sobre Ouro Preto revelam as riquezas arquitetônicas, históricas e culturais da cidade mineira, e nesta ficção a autora da FAUSTO expõe os antagonismos da fé.

Nenhuma palavra é em vão para Eliana de Castro. A autora de NANA e, agora, de Valha-me Deus, além de fundadora da revista FAUSTO, não trabalha com superficialidades — nem mesmo ao, eventualmente, falar de coisas banais. Até porque, para ela, nada é banal.

O seu olhar de romancista capta a mais ínfima minúcia do cotidiano. A busca incessante pela beleza se reflete em sua prosa poética, densa, dúbia e aforística.

Em Valha-me Deus, principalmente para quem busca livros sobre Ouro Preto, a cidade é arena das treze personagens, cujas vidas se entrelaçam devido a um acontecimento na Praça Tiradentes, não ao acaso. Porque, assim como no texto de Eliana de Castro, nada em Ouro Preto é ao acaso.

As treze mulheres têm nomes de cidades mineiras. Da mais simples a mais cosmopolita, suas mineirices manifestam-se não de maneira ufanista, mas espiritual.

Na Vila Rica das montanhas faustosas, os antagonismos da fé exacerbam-se no encontro do profano com o sagrado.

Espiritualidade é um tema caro à Eliana de Castro. Para quem acompanha a FAUSTO e conhece a formação da autora, não é nenhuma surpresa.

Na revista, a escritora já postou entrevistas com líderes religiosos e intelectuais que estudam a temática; na academia, fez mestrado em Ciência da Religião na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sendo orientada pelo filósofo Luiz Felipe Pondé.

E por que  Ouro Preto? A cidade, tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 1938 — sendo a primeira cidade brasileira a receber o título de Patrimônio Mundial pela Unesco, em 1980 —, tem todos os elementos para um romance sobre fé.

Logo, é impossível não colocar Valha-me Deus numa lista de livros sobre Ouro Preto.

A começar pela sua estética barroca. Das igrejas às casas, a arquitetura não deixa ninguém passar indiferente pelas ladeiras íngremes forradas de pedras. Construções essas que foram levantadas por mãos negras que incrementaram o catolicismo europeu com suas crenças.

Falar de Ouro Preto é falar de Brasil. País marcado pelo sincretismo religioso, teve na outrora Vila Rica o encontro de povos movidos pela ambição, religiosidade e sobrevivência.

O ouro arrancado de seu solo foi lavado com sangue e lágrimas, fluidos que encharcaram o cobiçado metal nobre e que ainda adornam esse canto das Minas Gerais, em que o tempo é um mero coadjuvante.

E é nesse cenário que as personagens mostrarão ao leitor as suas faces, como um laboratório que examina a natureza humana, essa indomável. “É impossível conhecer a natureza humana sem antes trancar a porta”, escreve Eliana no prólogo de Valha-me Deus.

E, mais uma vez, a autora reitera a coerência de seu trabalho. Em FAUSTO e em NANA, Eliana, através de sua prosa poética, destila perguntas e aforismos que levam o leitor a passar novamente o olho sobre aquelas linhas provocadoras que sempre colocam o nosso inexorável eu contra a parede — e nos faz trancar a porta.

A nossa natureza fica mais explícita onde anjos e demônios caminham como meros transeuntes na estrada que se bifurca para o sagrado e o profano — caminhos que constroem a narrativa humana.

A trajetória de Eliana é marcada por temas atemporais. Seja na FAUSTO, NANA ou neste novo romance, “a mulher dos clássicos” — como a própria autora gosta de dizer sobre si mesma —, sempre dedicou seu tempo a assuntos que nunca sairão de moda. Mesmo ao tratar de questões pontuais com seus entrevistados, as perguntas, em sua maior parte, poderão ser feitas daqui a anos e, ainda assim, serem pertinentes.

Da mesma forma que NANA, Valha-me Deus não será literatura para entreter. O leitor que se aventurar pelas páginas do novo livro terá que dedicar tempo para apreciá-lo, em um ato de contemplação.

A própria autora pensava, a princípio, que o seu texto seria mais leve nessa obra: a paisagem bucólica de Ouro Preto passava essa mensagem para a escritora, imersa no caos paulistano.

Mas Eliana não poderia fugir da sua verve: em suas visitas à cidade mineira, a escritora, mais ambientada ao local e aos locais, passou a enxergar a faceta sombria que compõe, inextricavelmente, a história de Ouro Preto.

A linha tênue entre o profano e o sagrado em uma cidade marcada pela religiosidade assumiria contornos literários magníficos no imaginário da autora, que segue com a sua primorosa habilidade de escrutinar suas personagens a ponto de nós, leitores, sentirmo-nos mais uma de suas criações, dada a identificação.

Um escritor, tal qual um músico, enfrenta um grande desafio quando seu primeiro trabalho é uma obra-prima: atingir a expectativa do público, ainda mais quando este é qualificado.

Valha-me Deus vem na esteira de NANA, obra de estreia de Eliana de Castro, lançada em 2023, que mais parece um romance de uma veterana.

Mas isso tem explicação: a idealizadora da FAUSTO faz literatura não somente por ofício, mas como missão.

Com uma história de vida que poderia facilmente ser romanceada, a autora encontrou na escrita a sua própria redenção.

Valha-me Deus, assim como NANA, mostra que Eliana de Castro faz jus aos clássicos em que foi forjada.

Ouro Preto foi visitada pela autora no começo de 2023 e, desde então, uma forte ligação foi criada entre o gênio criativo da escritora e a cidade.

Ao observar nomes femininos dos municípios mineiros, veio a ideia de fazer um romance ambientado na antiga Vila Rica. Uma ficção contemporânea precisa constar nos livros sobre Ouro Preto que, costumeiramente, são históricos.

Outras visitas feitas posteriormente reforçaram esse laço espiritual entre Eliana e Ouro Preto. E, ao ter um maior contato com moradores e figuras icônicas da cidade, a vontade de romanceá-la se tornou ainda maior. “Não há coincidência nesta cidade”, diz o prólogo. E Valha-me Deus é a prova disso.

Prepare-se para subir o Morro São Sebastião e avistar Ouro Preto do alto, com igrejas a perder de vista.

Lá embaixo, Mariana, Mirabela, Heliodora, Januária, Conceição, Leopoldina, Rubelita, Cássia, Cristina, Virgínia, Açucena, Maria da Fé e Carmésia trancam as suas portas, mas o Pico do Itacolomi vê tudo pela janela.

Ah, e Pichorrero, o cachorro da cidade, é testemunha…
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Túlio França Escrito por: