Uma mulher livre das convenções sociais, mas prisioneira das próprias emoções, Sylvia Plath foi assim.
Os dois mundos em que habitava a oprimiam: o externo, que a tornava escrava de sua própria imagem; e o interno, incapaz de sustentar tanta exigência consigo mesma.
A poeta americana, comparada à figura mitológica de Ísis pelo escritor Carl Rollyson, é retratada em mais uma biografia.
Ísis Americana tem quase 400 páginas e é uma viagem fascinante pela vida da autora de A Redoma de Vidro, famoso romance de 1963.
Sylvia Plath suicidou-se aos 30 anos, em 1963.
Por seu caráter zeloso e pela representação maior da essência materna e da esposa ideal — características de Ísis —, a poeta viveu para ser perfeita. Quando percebeu que não mais conseguiria, desistiu.
Sua obra poética é do gênero confessional, como a de Anne Sexton, Robert Lowell e W.D. Snodgrass.
“Plath precisava que uma plateia testemunhasse o espetáculo do que significava ser Sylvia Plath”, escreve Carl Rollyson.
Mas o que era ser essa mulher?
Carl Rollyson revela na biografia a filha da controladora Aurelia, a jovem de muitos amantes — sobretudo Richard Sassoon — e a esposa de Ted Hughes, também escritor, intenso como ela, que Carl descreve perfeitamente como “a contrapartida masculina dela.”
O livro conta tudo, porém não como os biógrafos anteriores de Sylvia Plath. O autor decidiu revelar mais os aspectos que os outros não revelaram.
Sobre o Ted apaixonado, por exemplo, Rollyson escreve: “Ela é a criatura mais interessada do mundo, acerca de tudo”.
Feliz, adaptado à vida doméstica, viveu com Sylvia anos intensos e trocas interessantíssimas sobre a arte de ambos, escrever. Numa entrevista para a Paris Review, Ted declarou: “Sylvia não era apenas ela mesma, ela era os Estados Unidos e a literatura americana encarnados.”
Mas Ted traiu Sylvia.
Foi a separação repentina que levou a escritora ao fim.
A vida perfeita que construíram revelou-se uma mentira para Sylvia, que não suportou a traição de Ted e suicidou-se.
O casal teve dois filhos: Frieda e Nicholas.
Uma das primeiras curiosidades que a pesquisa de Carl Rollyson provoca é a comparação de Sylvia Plath com Marilyn Monroe. O autor explica que é a obsessão pela própria imagem e as crises emocionais que as aproxima.
Contudo, parece injusto que a profundidade da alma de Sylvia seja comparada à superficialidade de Marilyn.
Curiosamente, um dos traços que Carl Rollyson deixa muito evidente nessa biografia é a dedicação da poeta aos estudos.
Como sua devoção ao conhecimento era, como toda devoção, um alimento, Sylvia Plath, toda vez que adoecia, temia muito mais pelas notas e pelo rendimento, do que pela própria saúde.
Leiamos mais um trecho:
“A leitura de 40 páginas de história toda noite convenceu Sylvia de que ela não possuía “bagagem”. Era como bater a cabeça “de encontro ao conhecimento de séculos”, confessou em seu diário. Para alguém da idade dela, sua compressão do passado e das questões contemporâneas era impressionante. Mas agora percebia a diferença entre o acadêmico e o meramente bem informado.”
Foi assim que Sylvia Plath formou repertório e sua capacidade intelectual foi abrindo terreno para uma carreira bem-sucedida como escritora.
Como relata Carl Rollyson, “Plath foi uma incansável candidata a prêmios literários, não apenas devido ao valor monetário deles, mas também porque a mantinha visível ao público.”
Uma estratégia inteligente para ganhar os holofotes do universo popular, uma vez que Sylvia Plath não queria fazer parte do mundo pedante dos acadêmicos.
Ela era uma mulher livre.
“O que soava ofensivo a outras pessoas divertia Sylvia que era por natureza satírica”, revela o biógrafo.
Por fim, uma mulher disposta a amar como Sylvia sempre fora, também não tinha lugar na academia:
“O que deu estrutura a Sylvia Plath — não só como poeta, mas como alguém criativa — foi sua profunda humildade, sua sujeição à História como um assunto que precisava ser dominado, sua rendição à autoridade de uma disciplina que faz parte do que, no fim das contas, a transformou numa escritora genial.”
Perceber que os mundos da arte nobre e da cultura popular estavam convergindo levou-a sabiamente a se desprender do estrito meio intelectual.
Sem deixar de aprender, Sylvia Plath conheceu os grandes clássicos e compreendeu — o tanto quanto pode — o mundo; ampliando assim o leque dos seus sentimentos para abarcar muitas mais nuances.
Carl Rollyson, biógrafo artífice das palavras, traça os contornos das almas literárias e culturais mais proeminentes.
Como sábio tecelão de histórias, entrelaçou os fios da vida de figuras como Sylvia Plath, Rebecca West, Norman Mailer e Martha Gellhorn.
Suas biografias são verdadeiros deleites. Seu olhar perspicaz, como o de um observador estelar, revela nuances escondidas, oferecendo-nos vislumbres profundos das vidas e das obras de seus escolhidos.
É claro que meu passo seguinte foi ler A Redoma de Vidro.
Isis Americana evidencia muito mais a mulher Sylvia Plath do que a poeta, mostrando pouquíssimos de seus versos —, o que, para mim, que sou da prosa, foi magnífico.
Essa foi uma escolha consciente de Carl Rollyson.
Aqueles que nunca tiveram contato com a obra da poeta certamente se apaixonarão primeiro por sua personalidade complexa, cheia de altos e baixos. E é claro que isso é o combustível por trás de seus versos passionais.
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