Quem Está Aí?, monólogos de Shakespeare: eu, vivíssima!

Quem Está Aí?, monólogos de Shakespeare, interpretado por Thiago Lacerda, é uma experiência de simplicidade e despojamento — e de um encantamento excepcional.

Com concepção e direção de Ron Daniels, tradução de Marcos Daud e Ron Daniels, Lacerda apresenta trechos das peças Hamlet, Medida por Medida e Macbeth. 

Com apenas uma mesa e uma cadeira, o ator cria uma atmosfera íntima e tece uma conexão que poucas vezes vi no teatro.

Eu, que tenho planos de virar justiceira dos espetáculos, empunhando uma arma a laser para expor quem insiste em violentar a segunda arte manejando celulares, durante a apresentação de Quem Está Aí? não vi um único aparelho a brilhar inconvenientemente.

Consideramos o óbvio: assistir a peças de Shakespeare é uma experiência única, que envolve todos os nossos sentidos, mesmo quando não temos tanta familiaridade com seus textos; no caso, os livros. 

O que cada trecho de Quem Está Aí? proporciona é uma expansão da imaginação e uma potência de energia até para o corpo.

Há quem entre no teatro com sono e saia com fôlego de criança. E o que falar da elegância da fala de Lacerda? O vocabulário, a gentileza no tom de voz, à altura!

É sabido que Shakespeare é o grande autor que enchafurda nos aspectos mais sombrios da natureza humana e que suas peças representam o homem em toda a sua essência. 

Shakespeare aborda temas como traição, assassinato, ódio, vingança, ciúme, amor; paixões capazes de despir o ser humano. 

Hamlet, por exemplo, é uma tragédia clássica que explora temas complexos como vingança, loucura, traição e mortalidade.  

A peça gira em torno do príncipe dinamarquês Hamlet, que vive assombrado pelo fantasma de seu pai, o rei, que clama vingança por seu assassinato, consumado pelo próprio irmão, Claudius.  

No decorrer dos atos, Hamlet luta com dilemas morais e emocionais, enquanto tenta desvendar a verdade e decidir se deve ou não se vingar.  

Medida por Medida, escrita no auge do período trágico de Shakespeare aproximadamente três anos após Hamlet, que foi contemporânea de Otelo, e pouco antes de Rei Lear e Macbeth —, dá ênfase não aos triunfos do amor, mas às questões morais, por exemplo, manifestação de obscenidades, decorrentes do desejo sexual, além do abuso de poder. 

Por fim, Macbeth é uma tragédia sombria que retrata a ascensão e a queda do protagonista homônimo, o nobre escocês consumido pela ambição e pela sede de poder. 

Instigado por profecias de bruxas e ainda influenciado por sua esposa, Lady Macbeth , acaba por cometer assassinatos, tudo para garantir sua posição como rei. 

Uma peça fascinante, não sem razão guarda frases muitíssimo famosas da literatura, e desvela a busca desenfreada pelo poder que acaba levando Macbeth à paranoia, à culpa e à ruína. 

As três peças são reconhecidas por sua profundidade psicológica, pelos diálogos icônicos, além das reflexões sobre a natureza humana. 

Hamlet e Macbeth são, sem dúvida, duas das obras mais reverenciadas da literatura mundial. 

Ao fim de Quem Está Aí?, fiquei com vontade de fazer um ano de leitura dedicada a Shakespeare, como estou fazendo com Machado de Assis, lendo todos os seus romances.

Mas Shakespeare é meta para toda a vida. Para prolongarmos os efeitos. 

Os textos de Shakespeare são tão poderosos que a simplicidade, a despretensão do cenário e do figurino só intensificou a experiência de ser capturada, o que soa até clichê. 

Mas é verdade. 

Meu corpo sentiu. 

Minha alma sentiu. 

Quem Está Aí? 

Eu! Vivíssima! 

Eliana de Castro Escrito por:

Fundadora da FAUSTO, é escritora, mestre em Ciência da Religião e autora do romance NANA.