Carl Rollyson: “A biografia é uma forma de conhecimento ímpar”

Prolífico biógrafo, Carl Rollyson é conhecido por suas obras detalhadas acerca de personalidades influentes da literatura e do entretenimento. Despertou-me o interesse para estar em minha casa por seu trabalho sobre a poeta Sylvia Plath. Com mais de 40 biografias publicadas, o escritor americano mergulha profundamente na vida e na obra de seus escolhidos, legando a seus ávidos leitores narrativas fascinantes. Além de Plath, Rollyson escreveu a respeito de Marilyn Monroe, Susan Sontag, Marie Curie, Norman Mailer, Rebecca West, Emily Dickinson, Pablo Picasso, William Faulkner — e dedicaríamos um tempo razoável para completar a lista. Como alguém que não escreve cansado construiu uma galeria como essa? A respeito de meu gênero literário preferido, sem mais delongas.

Carl Rollyson.

FAUSTO – Qual é o objetivo mais importante de uma biografia?
Carl Rollyson: A biografia é um gênero crucial para compreender uma pessoa como um todo — não apenas o que ela faz, mas o que significa ser, intrinsecamente, essa pessoa. Como tal, a biografia baseia-se em história, psicologia, sociologia e outras áreas do conhecimento; mas o que nem sempre é reconhecido é que a biografia é uma forma de conhecimento ímpar.

Por que o gênero foi tão mal visto por tanto tempo?
A biografia como gênero tem uma história longa e mista. Certos biógrafos como Plutarco são reverenciados; outros — bem, você pode citar qualquer número de contemporâneos —, são insultados. Há muito tempo disse John Marshall, acerca de sua biografia sobre George Washington, que os leitores queriam ter uma compreensão íntima dos biografados, mas Marshall evitou retratar George Washington como pessoa. Quando biógrafos contemporâneos fornecem retratos muito íntimos, ou infames, é o biógrafo — o mensageiro, por assim dizer — que vai para o opróbrio.

Qual é a melhor forma de trabalhar o anacronismo? Explicando os fatos ou simplesmente narrando os fatos?
A biografia deve ser uma narrativa, uma história da qual surgem todos os tipos de interpretações — algumas das quais o biógrafo pode querer elaborar —, e, em alguns casos, a biografia permite que os leitores simplesmente tomem suas próprias decisões.

Durante o processo da escrita de uma biografia, qual é o maior perigo para o biógrafo? Julgar contextos políticos, por exemplo.
O maior perigo que um biógrafo corre é identificar-se demasiadamente com um assunto, como se biógrafo e biografado fossem amigos, ou mesmo amantes. Um biógrafo deve sentir algum tipo de conexão com o objeto, claro, mas pode ser apenas por um detalhe.

Os livros de história renderam-se aos métodos das biografias para se posicionar no mercado editorial. Qual sua opinião acerca desse movimento?
Não creio que os livros de história tenham se rendido à biografia, mas alguns dos melhores historiadores, como H. W. Brands e Doris Kearns Goodwin, recorreram à biografia como um forma de atingir um público popular, um grupo de leitores que querem entender como indivíduos se cruzam com a história.

No Brasil, isso se tornou bastante comum…

Ser biógrafo de escritores é assumir-se um obcecado por literatura?
A biografia literária pode ser sobre o trabalho de um escritor, mas também pode ser sobre o escritor como pessoa, cujo trabalho pode não ser de maior interesse para os leitores. Um exemplo é o W. A. Swanberg, que escreveu uma biografia do Theodore Dreiser sem analisar seu trabalho. Swanberg não era um crítico literário, mas queria explorar um ser humano significativo de tal forma que a sensibilidade de Dreiser poderia se tornar a chave para a compreensão de sua obra como escritor, ainda que o biógrafo não tenha analisado a escrita de Dreiser em detalhes. Escrevi sobre Swanberg em meu livro Essays in Biography e num episódio recente do meu podcast A Life in Biography.

Qual foi a biografia mais difícil de escrever?
Minha primeira biografia foi a mais difícil porque eu não sabia escrever biografia. Levei quase seis anos para descobrir como fazer uma. Para escrever a biografia da Marilyn Monroe, tive que aprender como escrever uma narrativa, fazer da vida dela uma história, e para isso precisei da ajuda daqueles que foram entrevistados, além dos que leram o manuscrito e fizeram observações, e os editores que me ajudaram a moldar a biografia. Um momento chave foi quando a atriz Susan Strasberg disse: “Você realmente sabe o que está fazendo. Pare de tentar impressionar seus colegas acadêmicos.”

Quais personalidades o surpreenderam durante a pesquisa? Positiva ou negativamente.
Entrevistei o jornalista conservador William F. Buckley Jr. para a biografia da Rebecca West. Ele foi amigo dela e eu queria saber suas impressões a respeito dela. Como as opiniões políticas dele ofenderam muitas pessoas, criei a sensação de que ele seria uma pessoa difícil de entrevistar. Na verdade, ele foi exatamente o oposto — não apenas caloroso, envolvente e disposto a responder todas as minhas perguntas com profundidade, como também foi receptivo e interessado em meu trabalho, em minha trajetória, como colega escritor.

Sobre quais escritores gostaria de escrever, mas acabou desistindo?
Depois de completar a biografia em dois volumes de William Faulkner, me ofereceram o oportunidade de escrever a de Herman Melville. Comecei a trabalhar no livro, mas percebi que simplesmente não teria resistência para escrever uma biografia de um escritor desse porte, considerando todos os anos que seriam necessários para completar a obra. Hoje, em meados dos meus 70 anos, com o que tenho de energia e tempo, preciso ter cuidado com os compromissos que envolvem minha escrita.

Mantém rituais diários para começar e terminar de escrever?
Não tenho rituais. Quase sempre escrevo de manhã, por cerca de duas ou três horas,
quando minha energia é mais alta. Nunca escrevo quando estou cansado. Nunca escrevo por muito tempo. Sempre desisto quando estou prestes a escrever meu próximo pensamento para que eu tenha algo a ansiar pelo dia seguinte.
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Eliana de Castro Escrito por:

Fundadora da FAUSTO, é escritora, mestre em Ciência da Religião e autora do romance NANA.