Só podemos nos sentir pertencidos a algo que prezamos.
Quando o assunto é meio ambiente, o sentimento de pertencimento conduz-nos, até mesmo inconscientemente, às melhores práticas para preservarmos o que recebemos e legarmos os nossos recursos para as gerações vindouras.
Afinal, a sociedade, nas palavras do filósofo e político irlandês Edmund Burke, “é uma comunidade de almas que reúne os mortos, os vivos e os que ainda não nasceram”.
Em sua obra Filosofia Verde, o filósofo inglês Roger Scruton diz que o amor compartilhado pelo nosso lar é o motivo mais apropriado para a causa ambiental.
Conceitualmente, essa ideia é incorporada no termo grego Oikophilia. O amor ao oikos (lar) abrange as nossas ligações mais profundas, “contagia as emoções morais, estéticas e espirituais que transfiguram o nosso mundo, criando, em meio às emergências, um abrigo capaz de amparar as futuras gerações”.
Em seu atributo estético, o nosso amor pela natureza e a reverência para com o planeta Terra, o nosso lar, são justificados pelo belo, tido por Scruton como “o coração da Oikophilia”.
Essa apreciação distingue as coisas que têm preço, no sentido mercadológico do termo, das que não têm.
O valor vai muito além do meramente monetário ou contabilizável: não se trata de uma abordagem instrumental do meio ambiente, e sim do valor intrínseco que a natureza tem para a própria existência humana.
“Ao contemplar uma coisa como bela, o sujeito a eleva da arena dos interesses práticos e a dota de um valor que não pode ser cedido ou trocado […] o valor intrínseco da beleza confere utilidade de longo prazo às coisas belas, mas se trata de uma utilidade que surge somente quando não a buscamos”.
O psicólogo clínico canadense Jordan Peterson, em Além da Ordem, diz que o cultivo da beleza é um convite ao divino, um vínculo com o que está além de nós, isto é, uma conexão com o transcendente.
“Não podemos viver sem alguma conexão com o divino – e a beleza é divina – porque, em sua essência, a vida é muito curta, sombria e trágica. E devemos estar atentos, despertos e preparados para que possamos sobreviver e orientar o mundo adequadamente, e não destruir tudo, incluindo nós mesmos – e a beleza pode nos ajudar a apreciar a maravilha do Ser e nos motivar a buscar gratidão quando poderíamos, de outra forma, ser propensos a ressentimentos destrutivos”.
Termo caro do Romantismo, a beleza, neste recorte, apura a sensibilidade e a inteligência, e não há espaço mais adequado para que essas qualidades se desenvolvam saudavelmente do que o lar, porque nele não há contratos utilitários — ao menos não deveria haver —, então o divino se revela, sobretudo, nos vínculos.
Apesar de o sentimento de Oikophilia ser universal, ele manifesta-se mais essencialmente de uma maneira particular e localizada.
Amamos muito mais facilmente aquilo que faz parte da nossa identidade, que forma a nossa cultura e o nosso imaginário, que define aquilo que somos.
O amor pelo lugar em que se vive, o que inclui a comunidade e a tradição de uma nação, é a única forma possível de colocar a Oikophilia em prática.
Também podemos ver esse sentimento expresso em produtos artesanais, que carregam, em sua essência, toda a identidade e tradição de um povo, cujo legado cultural nos traz sabores, texturas e eflúvios que resistiram ao tempo e às mudanças históricas, adaptando-se ao novo sem perder a essência, isto é, o seu valor intrínseco.
Essa rede de afeto, que reúne vivos, mortos e os que ainda estão para nascer, junto ao senso de comunidade e tradição, faz com que todos nós sejamos agentes da conservação, aproximando pautas globais à nossa realidade local e nos unindo em um propósito em comum.
A Oikophilia nos livra das tendências do marketing corporativo ambiental, em que, na maioria das vezes, o parecer é mais importante do que o fazer. Só preservamos aquilo que amamos.
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