Mais do que um tipo de situação, as canções tristes pedem um tipo de personalidade. Naturezas específicas se inclinam para as sad songs como o girassol inclina o caule à posição da luz – e ver isso in loco é fascinante!
A canção triste é postura curvada do espírito.
Suas melodias sonorizam o mais íntimo da condição humana. O amor difícil de viver, o luto profundo dos rompimentos. As sad songs aliviam o espírito penoso, o que de outro modo precisaria de muita energia para sair desse estado de desorientação.
Naturezas inclinadas às canções tristes costumam ter olhar longínquo, que têm dificuldade de focar no presente. E na troca mais íntima é possível ver que há muita, muita imensidão em tão pequena parte do corpo.
Aliás, contemplar fotografias tristes permite compreender profundamente o significado do dito popular “os olhos são espelhos da alma”.
É mais do que sabido que a arte se alimenta saudavelmente da dor. E as mais belas criações — da música, da literatura, do cinema e por aí vai — são imbuídas de sentimentos melancólicos.
Claro, não com o intuito de tornar as sad songs em algo utilitário, mas é verdade que elas têm la seus benefícios.
Canções tristes diminuem — ou nos colocam em contato com — a solidão ontológica. Elas restituem as sensibilidades, permitem que façamos melhor distinção entre as emoções, as sensações e os sentimentos.
Elas facilitam a aceitação das perdas, porque suas melodias e composições abordam o negativo. Ocorre então uma reavaliação cognitiva dos sentimentos e das vivências dolorosas.
No reino das imagens, até a estética das capas dos singles e dos álbuns — assim como a identidade visual dos artistas — leva a um universo paralelo de ritmo mais lento, recolhedor e acolhedor.
As tonalidades são modernas e sofisticadas. Quase sempre escuros, os tons são frios, pesam, porque têm intenção, precisam comunicar o que nem sempre é possível dizer em palavras. É o imagético da melancolia, da tristeza e da solidão.
Em meus hábitos de recolhimento, as sad songs têm lugar de honra: S. Carey, Brandi Carlile, Birdy, Sigur Rós, Mark Wilkinson, Scott Matthews — que amo muitíssimo!
Além desses, Bootstraps, Sabrina Claudio, Sílvia Pérez Cruz, Ray LaMontagne, Noah Gundersen e, claro, o absurdamente maravilhoso Bon Iver, quem, aliás, motivou-me a escrever sobre o tema.
A canção exile, que Taylor Swift divide com Bon Iver em seu álbum Folkflore é belíssima. O álbum é uma incursão da artista pop no reino dos sentimentos sombrios.
Já Jim Croce, para mim, é muito triste.
Em um exercício livre, permito-me dizer que as canções tristes são conservadoras por natureza.
Nas letras há muitas paisagens, valores arraigados, muitas memórias. Elas abordam compromissos que independem de condições para serem mantidos e quando não são, o fracasso é tema visceral.
As canções tristes são conservadoras porque possuem maior senso de realidade — tomando emprestado com leveza o termo do Berlin.
E no que tange à imensidão espiritual em nós — independentemente de religião — as canções tristes mostram aquilo que ouvi tantas vezes nas aulas do Pondé — e foi algo muito marcante porque seus olhos se perdiam nesses momentos, um típico sad man — que espiritualidade tem mais a ver com agonia e vazio e ela vai muito além de um universo religioso “enquanto tal”.
Claro, tem Os Arrais! E Tiago Arrais.
Encerro com um trecho de exile:
You’re not my homeland anymore
So what am I defending now?
You were my town, now I’m in exile, seein’ you out
Algo como:
Você não é mais minha terra natal
Então, o que estou defendendo agora?
Você era minha cidade, agora estou no exílio, vendo você partir.
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Foi uma honra sua leitura. Espero que também aprecie e veja beleza em canções tristes.
E que também nos acompanhe em nosso Instragam!